quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A caixa de Pandora

Epimeteu, era um homem estranho que caminhava por estradas vazias, passava por pessoas e lugares e apenas continuava andando. Ele não reparava mais nas pessoas, pois a muito já tinham deixado de reparar nele. Para os outros, Epimeteu era apenas uma sombra ambulante, a personificação de algo que existe em todos, mas que ninguém gosta, tem medo. Para ele os outros eram estranhos em quem não conseguia confiar, não se permitia.

As vezes sentia uma forte vontade de se estabelecer num lugar como todo mundo, mas não conseguia, tinha que continuar sua busca. Ele sabia que sua busca não seria nada fácil, e talvez também nunca chegasse a seu propósito final. Tantos já haviam tentado e falhado, desde tempos imemoriáveis.

Certa vez quando parou para descansar conheceu algumas pessoas, já caminhava há bastante tempo sem parar. Se lembrando de tempos antigos antes de iniciar sua busca, antes de se preocupar com coisas inúteis, individualistas e repulsivas do mundo, ele se encantou com aquelas pessoas com quem se parecia. Essas pessoas que conhecera também pareciam estar perdidas e procurando algo. A diferença é que Epimeteu já sabia o que buscava, mas isso só o fazia mais triste e perdido, pois não se alienava na segura ignorância.

Por algum tempo se sentiu bem junto daquelas pessoas, no entanto sabia ele que essa alegria teria um fim próximo. Tentou preparar-se para tal, mesmo assim quando chegou a hora, se sentiu totalmente vazio, mais do que antes, pior do que quando estava sozinho, pelo menos até aquele momento.

Um pouco antes de partir de novo, pois lembrara de sua busca importante, conheceu outra pessoa. Epimeteu já havia estado com esta pessoa antes, junto com os outros. Mesmo assim agora era muito diferente, como se nunca a tivesse visto ou reparado. Se encantou de imediato, como se estivesse enfeitiçado; não pensava mais na solidão de sua busca, ate tomara forma novamente, deixara de ser apenas uma sombra. Sua busca fora novamente deixada de lado, parecia não ser necessária no momento.

Não mas que de repente aquilo tudo veio a baixo, ele nem mesmo sabia descrever como aconteceu, sabia que não existia mais. No lugar daquele sentimento que aquecia seu peito Epimeteu construiu um muro de concreto, para nunca mais ser aberto. Voltou a ser a mesma sombra, voltou a sua busca.

A estrada era de novo sua única companheira, fiel e devastadora. Ao mesmo tempo em que não o abandonaria em momento algum, não o acalantava, muito pelo contrario, minava sua vontade de continuar. No entanto Epimeteu jamais desistira, continuava na sua busca sem rumo por esperança.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Comuna de Paris: estória de uma classe. parte 2

Os poderosos que não fugiram tiveram de aceitar o poder popular. Não havia mais governo na cidade, os burocratas do Hotêl de Ville corriam agora se refugiar em Versalhes. A população teria de controlar Paris, pois jamais a entregariam na mão dos imperialistas que estavam a sua porta. Pensaram então em como organizar e manter toda Paris funcionando. O Diretório Central era a única instituição de poder popular no momento em Paris, eram os delegados eleitos por voto direto, representantes de cada bairro para organizar a Guarda Civil. O poder lhes caiu no colo, eles foram chamados ao Hotêl de Ville, resistiram, mas se viram impelidos a aceitar. Não aceitavam o comando da cidade, mas como pessoas apaixonadas por seu povo passaram a organizar o governo, e seu primeiro ato foi convocar eleições para colocar pessoas eleitas devidamente onde estavam. Havia muita desorganização, tempo era necessário, mas não o tinham, Paris precisava ser alimentada. Muitos desejavam a cabeça de Thiers, queriam marchar sobre Versalhes para destruir de vez a corja reacionária do Governo Provisório. Mas a decisão final foi que o povo parisiense precisava de mais atenção no momento.

A cidade festejava a libertação que haviam conseguido, e tentavam todos, organizar os serviços. Jornais, a polícia e outras instituições do governo foram tomadas pelo povo armado. Várias fabricas abandonadas pelos burgueses agora eram gerenciadas pelos trabalhadores como achavam melhor. Muitos dos serviços como correios, transportes, alimentação e previdência também foram abandonados pelos gestores que os comandavam, os funcionários proletários assumiram; enfim a cidade era do povo parisiense, não mais de seus exploradores.

Em alguns dias as eleições foram organizadas, o povo compareceu aos milhares para votar, nunca houvera tanta participação popular nas eleições. Dentre os eleitos estavam já conhecidos revolucionários que há tempos lutavam contra a burguesia, mas também figuravam homens simples, operários conhecidos apenas em seus bairros. Um dos mais votados pelos operários fora Eugène Varlin, um operário há muito conhecido por suas lutas, na liderança de greves, das associações de ajuda mútua e do restaurante comunitário que fundara. Era também um dos líderes da secção parisiense da Internacional. Um de seus votos foi dado por Joulon, amigo dos tempos de paz, quando podiam ter longas conversas na cede da Internacional; Joulon tinha ido até visitá-lo na prisão meses antes. Mas há algum tempo não tinham mais tempo de conversar, enquanto Varlin era comandante de um batalhão da Guarda Civil, Joulon servia em outro, desde o cerco de Paris pelos prussianos quase não se viram.

Durante a posse, mais de duzentas mil pessoas na frente do palácio do governo municipal acompanharam seus eleitos e festejaram juntos, aos serem apresentados um coro uníssono grita “Vive La Comune”, bandeiras vermelhas agitam-se por todos os lados. Agora a Paris revolucionária tinha seus eleitos, que deveriam fazer avançar, conjuntos ao povo, aquela revolução. No palanque estavam figuras muito diferentes, operários que até outro dia lideravam greves em suas fábricas agora estavam imbuídos de ajudar a governar Paris. Também havia pequeno-burgueses, representantes eleitos por um povo de várias classes e vários ideais quanto aquela revolução. As diferenças ideológicas se uniam neste momento, para fazer avançar a Paris livre. Assistindo com orgulho e esperança a posse dos eleitos do povo estava Joulon, que aplaudia com entusiasmo a cada anunciado, e especial carinho na vez de seu amigo Varlin. A seu lado estava outra amiga dos dois, uma conhecida lutadora dos direitos das mulheres e dos trabalhadores, Louise Michel, que desde janeiro vestia o uniforme da Guarda Nacional, e trabalhara incansavelmente para a vitória dos trabalhadores. Após a posse o povo parisiense saiu em passeata pelas ruas da cidade, festejando sua revolução.

Nos dias que se seguiram Paris ia cada vez mais se organizando, foram formadas comissões responsáveis por cada setor da vida da cidade. O povo participava ativamente dessa imensa reestruturação. Todos trabalhavam com mais leveza, apesar dos tempos de guerra, os trabalhadores iam com mais vontade exercer suas funções, sentiam que agora trabalhavam para si, para seu povo, e não para sustentar o burguês que lhe explorava. Mas não eram ingênuos, sabiam que a reação seria severa, a burguesia não veria calada a revolução proletária triunfar. Por isso ao lado da máquina de cada operário estava seu rifle, para assim, defender com a vida se preciso, a Revolução.