segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Prisão sem muros

Um estranho no ninho - parte 1 de 2


            Em tempos imemoriáveis, quando a raça humana ainda se amontoava em cavernas e pouco se diferenciava de outros hominídeos, uma outra espécie dominava o planeta. Os elfos reinavam soberanos sobre as outras espécies, com a diferença de que viviam em harmonia com o meio ambiente.Suas cidades se misturavam às florestas, sendo parte delas, perfeitamente integradas.
            Como eles chegaram aqui e para onde eles foram não é o ponto dessa estória, e sim a aventura de um jovem elfo chamado Joroln. Que era bem diferente dos outros de sua espécie em uma coisa, não se sentia bem em sua cidade-floresta. Os elfos, no geral, passavam a vida toda em suas cidades , saindo o mínimo possível, normalmente apenas viajando de uma para outra, mantendo o contato entre as nações élficas.
            Joroln cresceu imaginando como seria o mundo além das fronteiras de sua cidade sem nunca se sentir preparado para viver sozinho em terras distantes. A cidade onde vivia era a maior das nações élficas, ocupava um espaço maior que as atuais megalópoles humanas, contudo, se fosse sobrevoada, nem mesmo seria percebida como além de uma floresta. Ele andava por todos os lados da cidade, ainda jovem, mas um dos que mais conhecia aquela cidade, outros elfos não costumavam nem mesmo afastar-se muito além dos arredores de onde cresciam. Aqueles eram os costumes e a vida tranquila, com tudo o que precisavam. Apenas Joroln não se sentia bem, restrito aquele lugar, sentia-se preso.
            Quando completou sua maioridade devia escolher sua função na sociedade, não teve dúvidas ao escolher ser explorador. Foi facilmente aceito pelo conselho da cidade, pois muito poucos queriam aquela função, por muitas vezes ninguém. Joroln passou por um treinamento de sobrevivência em diversos ambientes e conhecimento de outras culturas. O treinamento durou vários anos, mas o tempo para os elfos é diferente.
            Já nos anos finais do aprendizado ele ia sozinho a vários lugares fora de sua cidade, as vezes até algumas outras cidades, mas nunca onde não havia sido mapeado por outro explorador anteriormente. Quando o treino foi terminado recebeu sua primeira missão, relativamente simples, iria com outro explorador continuar o mapeamento de uma zona árida a leste de sua cidade. Era uma viagem curta, voltaria em mais ou menos um mês, seria a primeira missão de Joroln como explorador e a última de seu companheiro.
            O percurso foi tranquilo, o elfo mais velho era muito experiente e conhecia bem o caminho, tinha desbravado sozinho a maior parte daquela região. Em uma semana de viagem, partindo da fronteira da cidade, eles alcançaram a orla da imensa floresta onde viviam. Dali pra frente o clima ficava cada vez mais árido, a medida que iam em direção ao leste, até a área que iria ser mapeada. Em mais uma semana  estariam em pleno deserto, já em uma zona inexplorada.
            Joroln nunca tinha estado em um deserto como aquele, um mar de areia, um vazio sem fim. Depois do primeiro dia caminhando e catalogando a região, ao por do sol começaram a armar as tendas para dormirem. Quando terminaram de arrumar o acampamento ele percebeu, jamais havia dormido fora de uma árvore, aquilo o deixou transtornado, só assim percebeu o quanto estava acostumado com seu ambiente nativo. Não dormiu nada aquela noite.
            Os elfos tinham uma ligação muito forte com a floresta, principalmente com as árvores, mais do que simplesmente uma moradia, sentiam-se parte daquele ambiente. A semana que passaram no deserto foi muito angustiante para Joroln, ele só pensava em voltar para o conforto da floresta. Depois dessa primeira viagem ele passou a ser o único explorador da cidade, e teria de voltar ao deserto sozinho.
            O tempo passou, e a cada viagem, a cada quilometro explorado Joroln se sentia menos incomodado pelo fato de não estar em uma floresta, mesmo assim a desejava todo dia que estava longe dela. Não mais sentia a sensação de estar preso, as explorações passaram a ser a maior parte de sua vida, enquanto a cidade e seu povo ficavam para trás. As vezes ficava mais de um ano em um ambiente, para pesquisar todas as estações, conheceu os mais diversos lugares e explorou também o mar. Se tornou muito experiente e conseguia cobrir cada vez mais terreno, coletava muitas informações dos lugares aonde ia, fauna, flora, geografia. Criou fama entre os elfos e por algumas vezes fez explorações para outras nações. Um dia recebeu um pedido de uma cidade ao norte da sua. Ainda mais ao norte havia um mar que nenhum explorador  jamais havia conseguido ultrapassar, apenas se sabia que existia terra do outro lado.
            Joroln aceitou o pedido como um desafio, nunca havia estado naquela costa. A sensação de estar em um lugar desconhecido e as histórias sobre o que haveria depois fizeram-no ficar tão animado como em sua primeira viagem. Tudo o que sabia sobre o outro lado era que os outros elfos que tentaram e voltaram, avistaram uma distante montanha. O mar era revolto, e a primavera teve de ser esperada para os ventos estarem na direção certa, o barco era o maior que ele já havia navegado e levava comida e água, supostamente,  suficientes para a ida e a volta. Foi sozinho, ninguém mais aceitaria aquela missão, nenhum elfo sentia-se bem à ir em direção ao desconhecido, Joroln era realmente um elfo muito fora do comun.
            Uma grande preparação foi feita, pelos relatos anteriores a viagem duraria cerca de um mês  até a costa do outro lado do mar, se nada desse errado. Joroln partiu nos primeiros dias da primavera, o vento soprava forte na vela e levava o barco em direção ao norte, para o mar aberto. Em poucas horas só se via água por todos os lados, completamente sozinho, atarefado com a coisa que mais gostava, livre.
            O percurso era muito duro, apesar da distância não ser tão longa, em outras águas mais calmas teria coberto mais que o dobro do espaço no mesmo tempo. O vento em mar aberto não ajudava-o como ele esperava, as correntes marítimas eram muito fortes e o distanciavam de sua meta. Com quase um mês passado desde sua partida avistou a ponta da montanha que haviam descrito, era a única coisa que indicava terra firme. Naquela noite uma forte tempestade quase afundou o barco, Joroln ficou toda a madrugada lutando contra a tormenta tropical, que por pouco não o matou, se o barco virasse não teria a mínima chance de sobreviver. Quase ao amanhecer, já com o mar mais calmo, caiu exausto no convés e dormiu a maior parte do dia. Quando acordou o sol já se adiantava a oeste, e sem saber como o barco tinha sido levado à apenas alguns quilômetros da praia, percebeu-se próximo ao seu destino.
            No entanto o que realmente chamou a atenção do elfo foi a imensa montanha, que se erguia colossal por detrás da floresta costeira. Ainda estava distante, mas já tomava boa parte da paisagem, um cenário lindo. Em sua base a floresta avançava até boa altura, depois davam lugar a escarpas rochosas e em seu cume a neve se acumulava, devido a altitude elevada. De imediato tratou de avançar em direção a praia para poder ter um descanso depois de tanto tempo no mar, queria conhecer aquela floresta, e mais ainda a montanha.
            Ao tentar avançar em direção à terra logo percebeu que não seria uma tarefa fácil. Uma corrente marítima cortava a costa e jogava a embarcação de volta para o mar aberto, aquele últimos quilômetros pareciam intransponíveis. Joroln decidiu esperar o anoitecer, torcendo para que o vento mudasse de direção, e soprasse para a costa, uma de suas velas tinha sido rasgada na tempestade da noite anterior e somente a menor lhe sobrava. Foi necessário muito esforço e perícia para vencer a corrente, era madrugada quando o barco, com muitas avarias, aportou na praia desconhecida.

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